Aquilo que é a nota característica da arte romântica era para ele a própria base da vida normal. Não via outra base. E, quando lhe trouxeram uma mulher apanhada em acto flagrante de pecado, e, mostrando-lhe a penalidade pela lei que ela devia sofrer, lhe perguntaram o que se devia fazer, ele pôs-se a escrever com o dedo no chão, como se não os ouvira, e, finalmente, instado pelos circunstantes, ergueu os olhos e disse: "Que aquele que de entre vós nunca pecou que lhe atire a primeira pedra". Valia a pena viver só para dizer isso.
Como todas as naturezas poéticas, amava os ignorantes. Sabia que na alma do ignorante há sempre lugar para uma grande ideia. Não podia, porém, suportar os estúpidos, mormente os que a educação estupidifica: aqueles que abarrotam de opiniões, de que não compreendem uma sequer, tipo peculiarmente moderno (...)
Aquele que ele salvou dos seus pecados são salvos simplesmente por belos momentos das suas vidas. Maria Madalena, quando vê Cristo, quebra o rico vaso de alabastro que lhe fora dado por um dos seus sete namorados, e derrama-lhe o balsâmico conteúdo sobre os pés cansados e poeirentos, e esse momentos precioso valeu-lhe o estar para sempre sentada com Rute e Beatriz nas grinaldas das rosas alvas de neve do Paraíso. Tudo o que Cristo nos diz, sob forma de uma pequena advertência é que devemos pôr beleza em cada momento, que a alma deve sempre estar pronta para a chegada do noivo, sempre à espera da voz do amante, sendo o filistinismo apenas aquele lado da natureza humana que não é iluminado pela imaginação. Vê todas as deliciosas influências da vida como modalidades de luz: a própria imaginação é o mundo da luz. É ela que faz o mundo e, todavia, o mundo não a pode compreender: e isso porque a imaginação é simplesmente uma manifestação de amor, e é o amor e a capacidade para o amor que distingue um ser humano doutro.
(Excertos retirados do Livro "De Profundis Seguido da Balada do Cárcere de Reading", de Oscar Wilde)
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