(...)
A voz do Pedro, ao responder-lhe, interrompe-lhe o curso do pensamento.
- Lavar o seu sangue? Não, Afonso, não dizes bem. Tivesse eu recolhido o seu sangue, haveria de o trazer comigo, encerrado em relicário santo. Até isso me foi negado. Mas se o não posso ter, hei-de ao menos vingá-lo.
É Pedro que se aproxima agora, lentamente, enquanto fala. - Que sabe o mundo de juramentos, Afonso? O juramento que lhe fiz, a ela e não ao meu pai e a minha mãe, o juramento que lhe fiz, só esse é verdadeiro e só esse conta e só esse me prende.
Afonso Madeira tenta desesperadamente afastar a imagem da ausente, que enche e domina a sala e lhe rouba a atenção, o olhar de Pedro. A imagem da morta é, bem sabe, capaz de varrer todos os vivos para a sombra do esquecimento.
- Afonso - murmura o Rei - nunca houve nem haverá no mundo amor maior que este.
(...)
Roubaram-te de mim, Inês, mas não sabiam que assim te punham para sempre em mim. Para sempre, até ao fim do mundo.
O caso triste, e digno de memória
Que do sepulcro os homens desenterra,
Aconteceu da mísera e mezquinha
Que despois de ser morta foi Rainha
(Luís de Camões)
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